6 de março de 2018, 19h32
Por Ana Pompeu
Impedir a execução provisória de pena depois de condenação em segunda instância é comprometer o sistema penal brasileiro como um todo. Isso porque ele se torna incapaz de punir criminosos em tempo hábil: gera impunidade e a prescrição da pretensão punitiva.
É o que afirma a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, em manifestação a favor da execução provisória da pena de condenados pela segunda instância da Justiça. Para ela, uma decisão contrária elevaria a sensação de impunidade.
Dodge enviou parecer ao relator dos processos que tratam no Supremo Tribunal Federal, ministro Marco Aurélio. Em duas ações declaratórias de constitucionalidade, o Partido Ecológico Nacional (PEN) e o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil tentam derrubar a execução antecipada da pena após decisão no segundo grau, pois a Constituição trata do trânsito em julgado.
Segundo a procuradora-geral, no entanto, impedir a execução provisória “compromete a funcionalidade do sistema penal brasileiro ao torná-lo incapaz de punir a tempo, adequada e suficientemente o criminoso” e “traz outras consequências indesejadas: o incentivo à interposição de recursos protelatórios, a morosidade da Justiça e a seletividade do sistema penal”.
Em 2016, por maioria, o Plenário do Supremo entendeu que o artigo 283 do Código de Processo Penal (CPP) não impede o início da execução da pena após condenação em segunda instância. O julgamento se deu no âmbito das liminares das ações. O relator, ministro Marco Aurélio, já liberou o voto para o Plenário julgar o mérito, mas a presidente, ministra Cármen Lúcia, ainda não pautou o tema.
Raquel Dodge classifica como um triplo-retrocesso que o Supremo reveja posição sobre o assunto. O sistema de precedentes brasileiro, para ela, perderia estabilidade e teria sua seriedade desafiada, enquanto a persecução penal no país “voltaria ao cenário do passado e teria sua funcionalidade ameaçada por processos penais infindáveis, recursos protelatórios e penas massivamente prescritas”.
Outro prejuízo, diz, ocorreria para a própria credibilidade da sociedade na Justiça, "como resultado da restauração da sensação de impunidade que vigorava em momento anterior".
A procuradora-geral também defende que seria injusto, errado e inconstitucional limitar a prisão apenas depois do trânsito em julgado após decisão do Superior Tribunal de Justiça e/ou do Supremo. Além disso, ela destaca que a jurisprudência da corte mudou e retomou o caminho que seguia até 2009 com o julgamento de um Habeas Corpus em fevereiro de 2016, sendo este resultado, inclusive, o que motivou a apresentação das duas ADCs.
O relator do caso, no entanto, tem entendimento oposto. No entendimento de Marco Aurélio, não há dúvida de que o artigo 283 do CPP se harmoniza ao princípio da não culpabilidade, segundo o qual ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença. De acordo com ele, a literalidade do preceito não deixa margem para dúvidas de que a constatação da culpa só ocorre com o julgamento em última instância.
Caso Lula
O julgamento pode mudar o destino do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), condenado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região a 12 anos e um mês de detenção. Nesta segunda-feira (5/3), o Ministério Público Federal da 4ª Região pediu ao TRF-4 para que rejeite último apelo do ex-presidente contra prisão para cumprimento de pena no caso triplex.
Já nesta terça (6/3), a 5ª Turma do STJ negou pedido de Habeas Corpus preventivo do ex-presidente Lula para tentar evitar a prisão. Por unanimidade, o colegiado seguiu o voto do relator, ministro Felix Fischer.
ADCs 43 e 44
Ana Pompeu é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 6 de março de 2018, 19h32 - Site Conjur - A imagem da capa do site Multisom foi retirada de arquivos da internet