Nada mais cultuado na política do que os fatos. Nem sempre, claro, pelo valor de face. Tudo pode mudar ou ficar igual se eles forem interpretados como “novos” ou “requentados”. Só aparecem como única alternativa quando viram “consumados”.
Mesmo assim dependem de como são olhados. Em geral, o que prevalece são as versões. É aí que o gogó de quem sabe entreter o dileto público pode fazer a diferença.
É assim, por exemplo, que Lula tenta se manter à tona. Faz de conta que nada teve a ver com a corrupção generalizada em seus governos. Seu mundo é outro.
Lula mostra-se tão surpreso com a roubalheira em seu terreiro como Michel Temer e Aécio Neves nos próprios pântanos. Todos se dizem inocentes e posam de vítimas.
A diferença é como cada um joga. Aécio é refém de si próprio. Depois que o papel de bom moço foi para o ralo, ele não consegue ir nem à padaria da esquina. Virou zumbi.
A única vantagem de Aécio é que ele não precisa pôr a cara a tapa todo dia. Pode se preservar em uma voluntária e confortável prisão domiciliar, enquanto mantiver os privilégios do mandato. Quando fala se esconde através do tapume de seus advogados.
Lula não tem a mesma opção de sair de cena. Tem que se manter na lida para não sucumbir. Na ótica de seus seguidores, seu papel é único, se desmoronar, não há quem o substitua. O que está em jogo é muito mais que divergências sobre rumos de governo.
Lula sabe que pode ir para a cadeia. Daí a pregação para os devotos. O apoio deles é sua melhor defesa, sua maior distância de uma cela.
Dos três, Michel Temer, que parece mais seguro, é quem pode levar o primeiro tombo. Vai ter que escapar, em um prazo relativamente curto, do julgamento pela Tribunal Superior Eleitoral do comprovado abuso do poder econômico pela chapa em que foi vice de Dilma Rousseff.
Apesar da consistência da denúncia, a expectativa, alimentada pelo Palácio do Planalto, é de que, de uma forma ou de outra, ele consiga pular esse primeiro obstáculo. É crível até porque a Justiça Eleitoral, outra jabuticaba brasileira, só costuma ser rigorosa com o andar de baixo.
Mesmo assim há dúvidas. Os juízes, mesmo os escalados durante o jogo, sabem que se se fugirem de regras claras, aplicadas em inúmeros outros casos, vão ser julgados aqui fora. Artifícios, filigranas e quaisquer outras manobras para salvar Temer vão pegar muito mal.
Se sair ileso do TSE, o próximo desafio de Temer até parece mais fácil — a rejeição pela Câmara do eventual pedido de abertura de processo no Supremo Tribunal Federal. Para sobreviver, ele precisaria do apoio de apenas um terço dos 513 deputados, uma barbada para profissionais da política.
Mas é justamente aí que o tal “fato novo” pode pegar. Ninguém sabe qual é a próxima parada da roleta. Pode ser fatal se for uma delação de Rocha Loures e/ou provas colhidas na investigação conduzida por Rodrigo Janot.
Se o vento virar, deputados são craques na mágica de transformar o status dos fatos.
A conferir.
Por Andrei Meireles 06/06/2017 - 07h00 - OS DIVERGENTES por email em 06/06/2017 - 12h05